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Da “pegadinha” ao título, Ney Franco fala de 3-6-1 e transformações no Flamengo campeão em 2006 – Flamengo Com Vc, Mengo


Por Redação em 18/10/2022 às 11:55:54 Técnico do bicampeonato da Copa do Brasil, Ney lembra com orgulho treino secreto no então pouco explorado Ninho do Urubu, cita ascensão de Renato Augusto e mudança com Toró As três Copas do Brasil conquistadas pelo Flamengo se entrelaçam pela existência de heróis improváveis. Teve gol de zagueiro em 1990, de atacante que era execrado e posteriormente viraria xodó em 2006 e até de volante que não chutava de longe na conquista do tri, em 2013. Mas o bicampeonato, vencido sobre o Vasco, é marcado por zebra no banco de reservas. Nem mesmo Ney Franco imaginava que seria campeão nacional com o Flamengo.

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Não por falta de confiança no próprio taco, já que desenvolvera um excelente trabalho no modesto Ipatinga, com direito a título mineiro em 2005 e semifinal da Copa do Brasil do ano seguinte contra o próprio Flamengo. O curioso foi como o convite rubro-negro aconteceu.

Então vice de futebol do Flamengo, Kleber Leite foi ao vestiário do surpreendente Ipatinga após apertada vitória dos cariocas por 2 a 1, que os classificou à final da competição, no dia 18 de maio de 2006. Lá, disse a Ney que demitiria Waldemar Lemos no final de semana seguinte e revelou interesse em contratá-lo.

A um mês de completar 40 anos e ainda um desconhecido no futebol nacional, desconfiou de pegadinha.

– Parece um roteiro de filme. Foi um momento muito especial da minha carreira. Eu trabalhei 10 anos nas categorias de base do Cruzeiro e depois tive minha primeira experiência profissional no Ipatinga. Dentro desse projeto do Ipatinga você já começa a sonhar alto em criar oportunidades em grandes clubes do futebol brasileiro. E você imagina um caminho a ser seguido até ser notado ou contratado por um grande clube.

– Mas te digo que, depois de um ano e seis meses à frente do Ipatinga devido ao trabalho de qualidade que foi feito por mim, pela diretoria e pelos atletas que lá estavam, esse caminho foi abreviado. E foi abreviado de uma forma muito interessante. Depois de duas finais de Campeonato Mineiro e chegar a uma semifinal com o Ipatinga, um clube de Série C, diante do Flamengo e no Maracanã, que é o templo do futebol brasileiro, vem o convite do Flamengo. Receber um convite no vestiário para trabalhar no Flamengo, eu te confesso que achava que aquilo tudo era uma pegadinha. No meio do futebol, cara, você tem muitas brincadeiras.

Ney Franco em sua primeira passagem pelo Flamengo, em 2006

Alexandre Cassiano / O Globo

Não era trote. Em 22 de maio, o Flamengo anunciava Ney Franco como treinador. Dois dias depois já estava em campo por 2 a 2 para o empate com o Santos. Foram mais três jogos até a parada para a Copa do Mundo, com derrota para o Fluminense (1 a 0) e vitórias contra Palmeiras (2 a 1) e Corinthians (2 a 0).

– Logo depois que a ficha caiu, vi que o negócio era sério. Foi a grande oportunidade que tive. Imagine um treinador de Série C ser convidado para dirigir a equipe de maior torcida do futebol brasileiro. Ainda bem que eu estava preparado, junto com a minha comissão técnica, tanto que ficamos um ano e quatro meses à frente do Flamengo. E o primeiro desafio era ser campeão da Copa do Brasil contra o Vasco da Gama, o principal adversário do Flamengo.

– Nesses dois confrontos com o Vasco houve o detalhe dos jogadores que decidiram, mas também o detalhe tático foi muito forte nessa final. E eu me sinto orgulhoso de, na primeira final com o Flamengo, ter tido a capacidade de ser campeão e de ter entrado na história do clube como treinador campeão. Esse trabalho seguiu principalmente com a conquista do Carioca de 2007. Essa porta foi aberta através do Kleber, que me confidenciou que acompanhava todo o nosso trabalho no Ipatinga. Dessa forma fui contratado pelo Flamengo.

Parada para a Copa: camisa 10 é pinçado da base, e Ney faz mudanças

Durante a parada para a Copa da Alemanha, o Flamengo fez uma excursão com amistosos em Manaus, Roraima e Maranhão. Aquelas semanas foram fundamentais para o desabrochar do hoje adversário Renato Augusto, indicação de Kleber Leite. E também serviram para uma série de transformações.

– Para mim, foi muito interessante a parada para preparar a equipe. Fomos para uma intertemporada em Manaus. E, nessa parada, respiramos a final da Copa do Brasil. Fizemos muitos treinamentos focados nessa final. Por eu ter enfrentado o Flamengo na semifinal, eu estudei muito o time. Quando assumo, não era uma equipe desconhecida. Conhecia o perfil da maioria dos jogadores que lá estavam.

– Me lembro que tive oportunidade de fazer alguns ajustes na equipe. Peguei um jogador como o Toró, que era atacante e trouxe para jogar como volante. Ele fez carreira depois dessa forma e nos ajudou muito na final. Tive a oportunidade de levar o Renato Augusto para treinar conosco e depois ele foi utilizado na final. Era um time que estava bem mobilizado para ser campeão.

Renato Augusto recebe oxigênio em Real Potosí x Flamengo

Agência O Globo

– Me lembro muito bem do Jônatas, além da qualidade técnica, tinha liderança. O próprio Diego goleiro tinha liderança. Conseguimos recuperar o Luizão, que estava no departamento médico, para a final. E tínhamos o Renato Abreu num momento muito bom, desequilibrando. Era uma equipe muito bem montada, muito forte. Consegui interagir com o grupo e nós conseguimos o título.

Ney voltou da excursão com uma ideia de jogo pensada, e Renato Augusto, com dois gols na bagagem e a certeza de que, apesar dos 18 anos, teria sequência.

Os primeiros resultados no Brasileiro após a parada, porém, decepcionaram. Goleada sofrida em casa para o Paraná (4 a 1) e derrota por 1 a 0 para os reservas do Vasco a três dias do primeiro jogo da final da Copa do Brasil, em que o arquirrival voltava a ser o adversário.

O surpreendente 3-6-1

Quando o Flamengo entrou em campo para a primeira partida da decisão, o esquema tático chamou atenção. Ney Franco montou o time no 3-6-1, esquema que foi visto com certo ineditismo pela imprensa local e que fez a torcida rubro-negra, reconhecidamente adepta do jogo ofensivo, torcer o nariz.

A escalação foi a seguinte: Diego; Renato Silva, Fernando e Ronaldo Angelim; Leonardo Moura, Jônatas, Toró, Renato, Renato Augusto e Juan; Luizão.

Juan fez o gol do título da Copa do Brasil, em 26 de julho de 2006

Divulgação/C.R. Flamengo

Três zagueiros e dois volantes por um objetivo: liberdade total a Léo Moura e Juan, que se tornariam os donos das duas laterais por muito tempo e chegariam à seleção brasileira posteriormente. Forças ofensivas do Flamengo, foram destaques nas duas finais. Léo cruzou para Luizão fazer o segundo gol no primeiro jogo da decisão e chuta a bola que sobra para Juan marcar o único da finalíssima.

– Essa forma de jogar no 3-6-1 eu já tinha colocado em prática na final com o Cruzeiro pelo Ipatinga. Coloquei um centroavante centralizado, fiz uma linha com três zagueiros para liberar os dois laterais. E a consistência com dois volantes, dois meias e um atacante de referência. Quando comecei a estudar o Vasco, no nosso caso ficou marcado que eu tinha o Léo Moura e o Juan, dois laterais que apoiavam muito e que tinham facilidade para apoiar em profundidade ou de virarem meias. Eles tinham qualidade para isso.

– Quando eu jogava numa linha de quatro, pedíamos para um lateral subir e segurávamos o outro. Mas era um confronto em que eu percebi que poderíamos utilizar dois laterais ao mesmo tempo no ataque, jogando do meio para frente. Optei por três zagueiros. Tínhamos o Angelim, que era canhoto, o Rodrigo Arroz, que fez a base de zagueiro e lateral, e mais o Renato Silva. Quis dar liberdade para os laterais e mudei a forma da equipe.

Para se chegar à inovação, Ney pediu a Kleber Leite para utilizar a estrutura do Ninho do Urubu, que à época só recebia treinamentos das categorias de base.

– O Flamengo nunca tinha jogado daquela forma, e foi essencial fazermos alguns treinos secretos. Conseguimos fazer isso num momento em que o Ninho do Urubu não era utilizado pela equipe principal do Flamengo. Na Gávea, seria impossível fazer um treino fechado. Na época, era inadmissível um clube do tamanho do Flamengo realizar treinos sem a presença da imprensa. E a gente fez isso.

– Iniciamos o jogo dessa forma, a equipe se portou muito bem no início do jogo. Logicamente que esses dois laterais sobressaíram no jogo. Hoje a gente vê que a decisão foi muito acertada porque a equipe se comportou muito bem defensivamente. Fizemos 3 a 0 no agregado, e esse detalhe tático ajudou muito, principalmente no desenvolvimento do futebol do Juan e do Léo Moura.

Esquema 3-6-1 é desfeito por lesão, e Obina resolve

Embora o 3-6-1 tenha dado solidez defensiva ao Flamengo, a conquista do título foi muito bem encaminhada após o esquema ter sido desfeito, aos 11 minutos do segundo tempo do primeiro jogo da decisão, quando o zagueiro Renato Silva se lesionou. Ney Franco colocou Obina e, após três minutos em campo, o camisa 18 conseguiu escanteio após ser lançado em profundidade e aplicar dois bonitos dribles. Escanteio cobrado por Renato Augusto, golaço de Obina.

Aos 17, o golpe de misericórdia. Obina tabelou com Renato Augusto e tocou na direita. Léo Moura levantou, e Luizão testou para pavimentar o caminho do bicampeonato.

Apesar de os gols terem saído após o retorno do 4-4-2, Ney tem convicção de que a vitória começa a ser construída a partir da confusão criada na cabeça dos vascaínos diante do inédito 3-6-1.

– Detalhe importante. O 3-6-1 no início provocou no adversário uma indefinição de como eles jogariam e como eles marcariam os nossos laterais. Naquele momento, eu tive a leitura do momento em que o Renato Silva machucou. Poderia colocar outro zagueiro, mas naquele momento o jogo pedia um atacante por dentro. Lembro que antes da final conversei com o Obina que o Luizão jogaria, mas que ele entraria a qualquer momento numa possível substituição ao Luizão ou na possibilidade de jogarmos com eles dois por dentro. E isso aconteceu.

O Flamengo vivia jejum de 14 anos sem títulos nacionais de expressão em 2006

Reprodução/Acervo O Globo

– O Obina entra, a nossa equipe ganha força ofensiva maior, mas continuei segurando um pouquinho o Jônatas como um terceiro zagueiro. Na mesma função que faz o Casemiro na seleção brasileira, e o Jônatas fazia isso muito bem. Logo depois que o Obina entra, a gente faz o gol. E, numa final, quem faz o primeiro gol tem uma tranquilidade para desenvolver o jogo melhor. E o Obina foi fundamental e entrou muito bem.

Em 2006, Flamengo vence Vasco por 2 a 0 na primeira partida da final da Copa do Brasil

No segundo jogo, uma semana depois, o vascaíno Valdir Papel foi expulso aos 16 minutos, e o Flamengo venceu por 1 a 0, confirmando o bicampeonato com muita tranquilidade.

Confira o gol do Juan na final da Copa do Brasil de 2006 entre Flamengo x Vasco

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Quais suas lembranças mais marcantes daquela conquista?

– A mudança da forma de jogar, o lançamento do Renato Augusto, a mudança de posicionamento do Toró, a recuperação do Luizão para a final, mas ficou muito marcado o treino secreto. A primeira vez que a equipe profissional utilizou o Ninho do Urubu. E ali a gente conseguiu mostrar para a diretoria a necessidade que o clube tinha de um centro de treinamento. Acho que o clube estava muito acomodado com a questão de só treinar na Gávea.

– Hoje em dia para se desenvolver um trabalho de qualidade, você não pode deixar um treinador exposto em um ambiente de clube. Detalhe que passa despercebido, mas eu fui o primeiro técnico a mostrar para a diretoria essa necessidade. Hoje os grandes clubes do mundo precisam disso e felizmente o Flamengo tem esse espaço hoje em dia, investiu nesse espaço. E também me sinto responsável por ter trabalhado nesse CT, por esse legado.

Sobre o Renato Augusto, como foi o acerto com o Kleber Leite para a subida dele. O Kleber o indicou, e você logo se impressionou com ele na excursão ao Norte e ao Nordeste, certo? Foi rápido o encaixe dele no time, né?

– A primeira vez que ouvi falar do Renato no clube foi através do Kleber Leite. Tivemos uma reunião interna onde procurávamos um camisa 10, sentíamos falta de um camisa 10. O clube, se contratasse alguém para a posição, não poderia inscrever na competição.

– Numa dessas reuniões o Kleber me falou sobre um garoto da base chamado Renato Augusto. Dessa forma o levei para a intertemporada. E nos treinamentos mostrou tudo aquilo que o pessoal da base falava sobre ele e aquelas informações que o Kleber tinha me passado também.

– Nessa intertemporada, ele entrou bem e com personalidade. Rapidamente se adaptou ao grupo. Além da parte técnica, é muito inteligente e de fácil trato. Aproveitou a oportunidade dentro de campo, o que me deu tranquilidade para lançá-lo numa final de Copa do Brasil.

– Foi um achado interessante porque ele foi bom para o clube. Trouxe retorno técnico no momento certo. Eu tive a grande oportunidade na minha carreira ao dirigir o Flamengo, e o Renato teve a oportunidade de se apresentar para a grande torcida do Flamengo em plena final de Copa do Brasil e contra o grande rival. Ele aproveitou bem.

Como é, 16 anos depois, ver o que se tornaram Flamengo e Renato Augusto? O Flamengo voltou a colecionar conquistas de peso, e Renato virou um jogador internacional.

– Em relação ao Flamengo, mudou a estrutura. Hoje o clube usa melhor sua torcida, sabe valorizar melhor sua marca. Conseguiu encontrar dentro da economia brasileira uma forma rentável de gerir o futebol. Economicamente tem fechado no azul, na nossa época não acontecia. Foi um grande salto. O Flamengo hoje tem um dos centros de treinamentos mais estruturados do futebol brasileiro, e isso dá ao profissional que está lá maior condição de se desenvolver um trabalho com qualidade.

– Essa exploração da marca fica dependente do resultado de campo. O Flamengo tem sido feliz na montagem da equipe, e isso vem correspondendo em campo com títulos, como Brasileiro e Libertadores. Nesse ano tem essa possibilidade real de mais dois títulos, um nacional e outro internacional.

– Renato Augusto fez uma carreira muito bonita. Fico feliz de ter sido um dos colaboradores e fui um mecanismo de formação na carreira dele. E é legal ver o atleta no qual Renato se transformou. Multicampeão, com experiência em seleção brasileira, finalizando sua carreira num grande clube como o Corinthians e com passagem muito marcante. Fazendo essa retrospectiva, a gente vê que o Renato aproveitou todas as oportunidades que teve desde o início lá no Flamengo.

Foi o título mais importante da sua carreira?

– Tive algumas conquistas em momentos diferentes, lógico que um título com o Flamengo melhora muito seu currículo. São inesquecíveis o que passamos, mas há também conquistas como o Mineiro com o Ipatinga. Representou muito para mim. A Série B com o Coritiba também. Perdemos mandos de campo e fizemos trabalho de excelência. Os dois títulos com a seleção brasileira, Sul-americano e Mundial com uma geração espetacular com Neymar, Lucas, Casemiro, Coutinho, Alex Sandro, Oscar, Danilo, Dudu… Aquilo representou muito. E o título da Sul-Americana com o São Paulo.

– São momentos, mas logicamente o título da Copa do Brasil pavimentou o meu caminho para desenvolver um trabalho a longo prazo no Flamengo. Fiquei um ano e quatro meses no Flamengo num momento em que o clube trocava treinador de três em três meses. Tem importância enorme.

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