O Flamengo apresentou ao público a experiência do jogo de futebol dividido em três partes: primeiro tempo, segundo tempo e entrevista coletiva, esta última esperada como se os 90 minutos da partida fossem uma preliminar. Aguardava-se o pronunciamento de Paulo Sousa e dos dirigentes tanto quanto a partida contra o Goiás e, se a ideia foi colocar um ponto final do caso Diego Alves, a grande questão são as feridas que ficam abertas. Um capítulo pode ter sido fechado, mas o que resta dele? Como impacta no ano rubro-negro? O episódio é muito revelador da forma como o Flamengo conduz seu dia a dia.
Era difícil olhar para a entrevista coletiva sem ter a sensação de que a parte mais forte não estava presente: o próprio Diego Alves, mas não o goleiro individualmente, e sim as lideranças do elenco. Diego queria um pronunciamento público e, para solucionar uma questão entre um jogador e o treinador, o Flamengo criou uma mobilização de cúpula. Levou para a frente das câmeras muito mais do que Paulo Sousa: foram dar explicações o vice-presidente e o principal executivo de seu departamento de futebol.
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Marcos Braz, Paulo Sousa e Bruno Spindel em coletiva do Flamengo — Foto: Fred Gomes
Marcos Braz, Paulo Sousa e Bruno Spindel em coletiva do Flamengo — Foto: Fred Gomes
Durante a semana, a uma reunião no Centro de Treinamento, Diego Alves tampouco foi sozinho. Levou com ele um grupo de jogadores para respaldá-lo. Na coletiva deste sábado, Paulo Sousa teve que admitir ter errado na escolha de palavras, apontou falhas de comunicação e, ainda assim, restaram outros personagens expostos, como o executivo Bruno Spindell, um fisioterapeuta e um preparador não nomeados. É claro que resultados de campo e uma subida de produção do time podem restaurar o status do português, mas é quase um padrão a forma como o Flamengo produz a eterna sensação de fragilidade de seus treinadores nos últimos anos.
Não é dizer que Paulo Sousa não tenha errado. A entrevista em que expôs Diego Alves, na última quarta-feira, foi um movimento que resultou numa espécie de incidente diplomático, que fez o oposto de fortalecê-lo num ambiente já desafiador para treinadores, num clube que os submete a uma eterna e insana pressão. A maneira como o treinador abordou o tema e a tentativa de corrigi-lo parecem resultar de um padrão do Flamengo: seus treinadores dividem o tempo entre treinar o time se defender do entorno, do ambiente em um clube fracionado e politicamente tenso, e até da assombração de 2019.
De Jorge Jesus para cá, a história se repete. Domenec Torrent precisou vir a público defender seus métodos, deixou que escapassem dados sobre questões físicas, parecia numa luta diária para convencer o clube que o contratara de que suas ideias poderiam funcionar. Rogério Ceni viu seus últimos dias marcados até pelo vazamento de um áudio de um analista de desempenho, enquanto o Ninho do Urubu não hesitava em deixar chegar ao meio externo informações sobre atritos com atletas, dirigentes ou funcionários. E agora é Paulo Sousa, a quem já se atribuiu falta de sensibilidade com atletas, antes do caso Diego Alves ganhar a dianteira. De 2019 para cá, o grande vencedor no Flamengo foi um treinador que colocou no bolso a chave do futebol rubro-negro, fechou o campo de treinos, limitou o acesso e as interferências e, quando foi embora, levou consigo todos os processos. O Flamengo precisa estabelecê-los novamente, compreender como pretende fazer futebol e reduzir a instabilidade de quem quer que passe pelo comando. Dinheiro é cada vez mais importante no jogo. Mas muitas vezes não basta.
E, de novo, o fato de Paulo Sousa ser mais um a viver tal instabilidade não significa uma defesa de todos os seus métodos. Voltando ao campo, o jogo com o Goiás trouxe, outra vez, uma frustração na expectativa de que o Flamengo mostrasse crescimento. Afinal, a partida contra a Universidad Catolica dera bons sinais. Na coletiva, quando pôde falar de bola, Sousa instigou os jornalistas com uma frase: “Comparem a postura tática dos times da Libertadores com os do Brasileirão”.
Provavelmente se referia ao fato de, no torneio sul-americano, o Flamengo ter enfrentado rivais que tentaram pressionar desde a saída de bola e permitiram espaços atrás. No torneio doméstico, o rubro-negro teria lidado com defesas mais fechadas. E de uma coisa Paulo Sousa não pode ser acusado. Mesmo num jogo marcado por uma pressão quase surreal, em que até uma fotos de Jorge Jesus apareciam na arquibancada, ele arriscou. Tirou um volante e colocou Pedro, numa adaptação ao que esperava do Goiás de Jair Ventura: linha de cinco homens na defesa e negação de espaços.
Além de Pedro na referência, buscando ocupar a área e empurrar para trás a defesa rival, Paulo Sousa parecia querer que o time abrisse campo. Por vezes, Gabigol iniciava jogadas bem perto da linha lateral, enquanto Bruno Henrique ou até Ayrton Lucas abriam campo na esquerda. Boa parte da boa produção rubro-negra nos minutos iniciais aconteceu graças aos movimentos de Gabriel. Ora aberto, ora recebendo a bola mais atrás, invertia posições com Everton Ribeiro e Matheuzinho pelo lado direito. Usando toda a largura do campo, o Flamengo gerou o espaço na defesa do Goiás: Gabigol recebeu a bola na ponta e lançou Matheuzinho entre o ala e o zagueiro do time goiano. Saiu o gol de Pedro. A escalação se justificava.
O Flamengo fez 25 a 30 minutos de ótimo padrão, com mobilidade dos homens de frente e um jogo que fluía. Aos poucos, no entanto, foi perdendo tudo isso. Teve sempre o controle, raramente sofreu, mas a produção ofensiva foi baixando. Paulo Sousa reaproximou Gabigol de Pedro no ataque, mas o time jamais recuperou a criatividade. Tentou voltar à formação inicial no começo do segundo tempo, mas o rubro-negro já não se estabelecia no campo ofensivo. Ao defender mais atrás para contragolpear, o time criou um contexto desfavorável a Pedro. Mas Sousa optou por não tirá-lo. As entradas de Andreas Pereira e João Gomes nos lugares de Éverton Ribeiro e Gabigol não ajudaram, mas pareceram ter motivos físicos. O fato é que o segundo tempo foi muito pobre e, sem produzir com bola, o Flamengo flertou com o risco até o último lance, quando Apodi perdeu enorme chance de empatar.
Mais do que três pontos, o Flamengo precisava sair do Maracanã com a certeza de que, por um tempo, só se falará de futebol. Os próximos dias dirão se o objetivo é realista.
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