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Eleição Flamengo – Ricardo Hinrichsen: ‘Precisa acontecer no futebol o que aconteceu no departamento de finanças’


Ricardo Hinrichsen é o candidato à presidência do

Flamengo

pela Chapa Branca – Flamengo Sem Fronteiras. Em entrevista exclusiva ao

LANCE!

, o administrador, que já ocupou os cargos de diretor executivo e vice-presidente de marketing, tem como uma das prioridade no plano de governo a independência política e profissionalização total do departamento de futebol.

Assista no vídeo acima!

Com experiência profissional na área, Ricardo Hinrichsen também destacou as mudanças que propõe no relacionamento com o torcedor em vários aspectos, como política de preço, programa de sócio-torcedor e nacionalização da marca – sobre a gestão do Maracanã, apuração sobre o acidente do Ninho do e mais.

O

LANCE!

publicará a entrevista com Walter Monteiro (Chapa Ouro – Flamengo Maior) nesta quinta. O atual presidente Rodolfo Landim (Chapa Roxa – UniFla) preferiu não atender a reportagem. A entrevista com Marco Aurélio Asseff (Chapa Azul – Sempre Flamengo) foi ao ar nesta terça. Confira clicando

aqui

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L!: Começando por uma questão mais particular, por que Ricardo Hinrichsen é candidato à presidência do Flamengo?


R.H.:

Essa é uma pergunta que todos me fazem. Eu fui vice-presidente de marketing há mais de 10 anos, entre 2006 e 2009, mas nunca militei politicamente no Flamengo. Até porque sou uma pessoa de perfil técnico, trabalho na área de esportes, então nunca tive interesse em militar politicamente. Essa candidatura tem como objetivo e achamos importante levantar algumas bandeiras. Por isso estamos aqui. Não é uma candidatura baseada no fato de eu achar que sou uma pessoa melhor ou que as pessoas que estão comigo são melhores do que as que estão lá. Isso não é verdade. Eu não sou mais inteligente, mais bonito ou competente do que o Landim.

Está acontecendo no mundo do futebol um processo de transformação muito violento, na Europa já vemos isso claramente, e esse processo vai chegar aqui. Está chegando aos pouquinhos e não vejo o clube se preparando para isso, para esse novo ambiente de futebol que não é o que estamos acostumados, com os clubes associativos fechados a uma quantidade pequena de pessoas decidindo. Vejo que essa agenda passa longe do clube. Pelo contrário, o clube, nos últimos anos, tem caminhado na direção oposta, na direção que deveria ser baseada em um pilar de abertura de um quadro associativo maior.

‘Está acontecendo no mundo do futebol um processo de transformação muito violento, na Europa já vemos isso claramente, e esse processo vai chegar aqui. Está chegando aos pouquinhos e não vejo o clube se preparando para isso’

O objetivo de todos nós é que o Flamengo siga sendo um clube que pertence ao seu sócio. Em vez de mergulhar no modelo associativo, em se tornar um clube desse modelo relevante, como é o Bayern de Munique, vemos o clube se fechando. Isso não vai funcionar pois os competidores do Flamengo não são os outros clubes associativos em dificuldade, como hoje. A médio e longo prazo, os competidores do Flamengo são empresas , como o Red Bull Bragantino. Aliás, não tem mais Bragantino. Acabou. O que se tem é o Red Bull. Esse tipo de competidor, que tem uma capacidade de investimento de fora do futebol, é que enfrentaremos; Esse modelo político, associativo com a gestão do futebol também política, com a influência dos amigos e parceiros, isso não funciona. Não vamos conseguir nos manter competitivos, no longo prazo, dessa forma, e vamos acabar perdendo, deixando pelo caminho, todo esforço feito, também por essa diretoria, desde 2013.

Como não vimos ninguém levantando essa bandeira, essa pauta que consideramos fundamental para o futuro do clube, fizemos aquilo que jamais pensamos em fazer, que é lançar a candidatura. Somos um grupo novo, talvez o caçulinha da política do Flamengo. Não tínhamos intenção de lançar candidatura, mas percebemos que ou entrávamos na disputa para levantar esse dedo ou isso ia passar batido. Quando o Flamengo fosse tentar se adequar à realidade, como está acontecendo com o Barcelona, agora, seria tarde demais.


L!: Quais os projetos para o departamento de futebol?


R.H.:

Se eu puder definir de uma forma mais objetiva e simples, eu diria que precisa acontecer no futebol o que aconteceu no departamento de finanças do Flamengo ao longo dos últimos anos. O que aconteceu? Duas coisas. Primeiro, blindagem da área política. Não há influência política dentro do departamento de finanças, que é tocado profissionalmente por pessoas técnicas. Tomam decisões técnicas e não políticas. O que ajudou nesse caso foi o fato de termos VPs que vêm do mercado desde 2013. Rodrigo Tostes, Walim Vasconcellos, Cláudio Pracowik. Todos são capacitados, apesar de serem voluntários, são do mercado dessa área.

No futebol, infelizmente, não conseguimos dar esse passo. O futebol é uma plataforma política na história do Flamengo. Não é esse governo ou no ano anterior. O fato é que conseguimos avançar em áreas como finanças, que não têm muito apelo político. Nenhum aliado político quer brigar para fazer parte de Conselhinho de Finanças para decidir sobre o fluxo de caixa do clube. Isso é muito chato, não é? Ninguém quer isso. As pessoas querem participar da discussão de quem será o próximo técnico, viajar com o avião do time, assistir ao treino. Isso tem valor político para as pessoas e não conseguimos fazer essa blindagem. Dizer: “Gente, desculpe, isso aqui não dá. O futebol é totalmente profissional.”

‘Precisamos profissionalizar completamente, incondicionalmente, o futebol. E como fazer isso? O conceito é afastar a influência política do dia a dia do futebol.’

Precisamos urgentemente fazer isso. Precisamos profissionalizar completamente, incondicionalmente, o futebol. E como fazer isso? O conceito é afastar a influência política do dia a dia do futebol. Conselhinho, VP voluntário… Afastar tudo isso. Isso se faz através da contratação de um diretor técnico. Temos, no Brasil, o fetiche com o técnico de campo. O Flamengo, em especial, por conta do Jorge Jesus.

Ele nos deixou um insight muito grande. Ele atingiu o nível de performance que atingiu porque, na prática, ele não era só técnico. Isso hoje está bastante claro. Ele era o cara que cuidava da grama, dava pitaco na fisiologia, influenciava no departamento de inteligência. Foi muito mais do que um técnico. Foi um diretor técnico de futebol. Assumiu o departamento inteiro durante o tempo que esteve aqui. Vimos os resultados disso.

Se não entendermos a lição que ficou dessa passagem do Jorge Jesus, se não fizermos o que precisamos fazer, vamos ficar para trás. O diretor técnico é tão ou mais importante que a figura do técnico. Uma figura com o Bielsa, no Leeds, não funcionaria se não tivesse um cara acima dele como Victor Orta, um diretor técnico igualmente genial. Comanda o departamento e determina todas ações de longo prazo que blindam o treinador. Precisamos ter essa figura profissional e dar condições, tempo e recurso, para trabalhar. E deixá-lo trabalhar. A partir daí, vamos de cima para baixo, construir um departamento de futebol que funcione.


L!: Uma nova concessão do Maracanã será decidida a partir de 2022. O que pensa a respeito da gestão do estádio? A ideia é mantê-lo como a casa do Flamengo?


R.H.:

Eu tive a oportunidade de, em 2007, participar do primeiro processo de estudo de concessão do Maracanã. Lá atrás, depois das obras para o Pan-Americano, o Flamengo, o Fluminense e a CBF foram procurados pela Secretaria de Esportes do Estado do Rio de Janeiro e a Suderj no sentido de buscar o modelo de concessão. O estádio havia sido reformado e queriam avançar para uma concessão. Eu fui um dos negociadores pelo lado do Flamengo. Foi uma negociação longa, que se arrastou até 2009, e envolveu também uma empresa britânica de marketing esportivo, a IMG, uma das maiores do mundo. Uma longa história que, no final das contas, não deu em nada.

Acompanhei, em todos esses processos, e tenho uma opinião formada com base em minha experiência em relação ao Maracanã. É a seguinte: o Maracanã não é um estádio de futebol como outro qualquer. O Maracanã não é o Engenhão. O Maracanã é um símbolo nacional, é um cartão-postal e uma ferramenta política. Sempre será. Para qualquer governador do Rio de Janeiro, o Maracanã será algo a ser pensado. Ele dá e tira voto. Isso significa que, mesmo em um processo formal de concessão, que assinemos um contrato de 20, 25, 30 anos, na minha opinião, sempre haverá grande insegurança jurídica para quem receber a concessão.

Ao longo de 25 anos, 30 anos, o Governo do Estado, que seguirá como dono do equipamento, mudará diversas vezes. Serão pessoas das mais diversas correntes políticas com pensamentos opostos. Já vimos anteriormente diversos exemplos de concessões de equipamentos públicos que, dependendo de quem está sentado na cadeira, não há menor pudor de rasgar contrato. Acho extremamente arriscado para o Flamengo entrar em um negócio de 20, 25 anos, em uma parceria que você não sabe quem irá te conceder e como essas mudanças irão impactar a relação com o agente que irá te conceder.

Acho também extremamente arriscado você ser sócio de outro clube. Não é nenhum preconceito específico com o Fluminense, não é isso. O que estou querendo dizer é que, assim como o Flamengo, são clubes associativos e políticas. Do mesmo jeito que não sei quem será o governador em 10 anos, e como ele pensará sobre essa concessão, eu não sei como pensará o presidente do Fluminense. Isso é extremamente perigoso.

O Maracanã é um estádio ideal em ponto de vista da logística, está muito bem localizado, existe uma relação afetiva com a história do Flamengo, só que o risco é muito alto. Entendo perfeitamente as dificuldades para a construção de um estádio próprio, já fiz plano de negócios profissionalmente. Sei o quanto custa, sei como é difícil. Sei a dificuldade que é, no Rio de Janeiro, a dificuldade de encontrar um terreno viável. Então, não estou dizendo que é uma coisa simples e fácil, mas, na minha opinião, pode ser a opção mais difícil e cara no curto prazo, mas, no longo prazo, é a que oferece a maior segurança ao Flamengo.


L!: E quanto à política de preço de ingressos?

R.H.:

É um dos pontos importantes da nossa campanha. Tenho uma frase que uso sempre: “Estádio não é fim. Estádio é meio.” No nosso plano de governo, que está disponível para baixar, damos exemplos no capítulo de marketing. Em especial do futebol alemão, que tem uma visão diferente em relação ao preço dos ingressos e sobre como usar o estádio para se relacionar com o torcedor. O estádio é uma plataforma onde você se relaciona e reforça os valores que você tem, da sua marca, e o tipo de relacionamento que você quer ter com o torcedor. E não apenas o torcedor que está no estádio.

O jogo contra o Corinthians, com aquela atmosfera, não contamina apenas as pessoas que ali estavam, mas todos que assistiram pela televisão. O torcedor do Flamengo em Manaus foi impactado por aquele jogo no Maracanã. É isso que precisamos entender. Não adianta subir preço de ingresso para ganhar na bilheteria em curto prazo, quando você está perdendo no outro lado, a médio e longo prazo.

Não vou entrar no mérito da perda esportiva, pois naturalmente torcida impacta no resultado de campo. Jogadores são pessoas e são impactados pela torcida na arquibancada e como ela reage ao jogo. É diferente. A torcida do Flamengo no estádio faz a diferença no ponto de vista esportiva, que, por sua vez, fará a diferença econômica lá na frente, com premiação. Mas tem mais que isso. Um estádio sempre cheio, com uma atmosfera, faz o clube ter melhores resultados e contratos, a médio e longo prazo, em outras áreas. Patrocínio, licenciamento. O estádio é a catedral onde se celebra a marca e a relação com a torcida. É a principal superfície de contato com o torcedor.

‘Os públicos mais popular e premium não são antagônicos. Não precisamos escolher entre um e outro em um estádio como o Maracanã. Pelo contrário, eles se complementam.’

Além disso, existe um último ponto que gostaria de destacar, e existem estudos que comprovam isso. Os públicos mais popular e premium não são antagônicos. Não precisamos escolher entre um e outro em um estádio como o Maracanã. Pelo contrário, eles se complementam. Funcionam como um ecossistema. As pessoas que vão ao estádio assistir um jogo percebem a qualidade da experiência com base em dois fatores. O primeiro, óbvio, é a qualidade do jogo em si. Resultado, se é emocionante, se o futebol apresentado é de alta qualidade. O segundo fator tão importante quanto é a atmosfera do jogo. Essa atmosfera é dada pelo comportamento do público. Não temos como ter uma atmosfera rica como é a do Flamengo, se não tivermos um público mais amplo. O público mais popular, que reage de outra forma, como foi no jogo contra o Corinthians, valoriza e aumenta a demanda das áreas premium. O cara que tem dinheiro e gosta de ir no camarote, vai sentir que valeu a pena pagar mais, não só pelo jogo, mas pelo espetáculo da arquibancada.

Precisamos de uma política de preço de ingressos que veja o todo. Não adianta ver só a árvore, mas a floresta toda. Essa é uma crítica que fazemos não só à política dos ingressos, mas também ao comercial do Flamengo como um todo. Foco no curtíssimo prazo e em arrancar dinheiro do torcedor, sangrar o torcedor, da maneiras mais rápida possível. O foco deveria ser construir a relação de longo prazo, que assim você ganhará muito mais. Do ponto de vista de marketing de negócios, a estratégia que existe hoje não faz nenhum sentido. Digo isso como profissional da área. O Flamengo está perdendo dinheiro a médio e longo prazo. Esse é o grande ponto.


L!: Ainda neste tema, quais melhorias e mudanças você pretende realizar no programa de sócio-torcedor do Flamengo?

R.H.:

O programa de sócio-torcedor é muitíssimo ruim. Acho que é uma unanimidade. É ruim em dois aspectos. E essa crítica é aos programas de sócio-torcedor, não apenas ao do Flamengo. Se propõe a ser o programa de benefício do ingresso. É basicamente isso, não dá nenhum outro benefício. Como programa de entrega de ingresso, se o analisarmos dentro dessa proposta, é muito ruim pois o sistema de prioridade que foi construído é um sistema que prioriza o curtíssimo prazo.

A longo prazo, irá canibalizar essa base. É o que está acontecendo com a final da Libertadores. Posso estar há anos pagando o programa, desde o começo, desde 2013, pagando em dia, e se cai alguém de paraquedas hoje, em um plano mais caro, ele cai na minha frente e vai furar fila. Isso não faz sentido nenhum. Esquece o futebol. Pensa em um transporte aéreo, uma loja de departamento. Imagine essa regra em um programa de relacionamento como esse. Na hora do bem bom, vem um cara que entrou agora e eu, que estou em uma relação de longo prazo como consumidor, fui passado bem na hora do filé mignon.

‘Em função da pandemia, praticamente não tivemos receitas de bilheteria. Os estádio estavam fechados. Ainda assim, o clube fechará o ano com R$ 1 bilhão em receitas. Tem necessidade de sangrar o torcedor? Precisou do dinheiro do sócio e do torcedor no estádio para chegar onde chegou? A prova está aí de que não precisava.’

Isso reflete a estratégia que comentei em relação ao preço do ingresso. É o foco no curtíssimo prazo. É algo que não consigo entender. Até entenderia isso em 2013, quando o clube precisava da maior quantidade de recursos no curtíssimo prazo para fazer frente a pagamento de salários, dívidas. Hoje, em 2021, com o clube faturando um bilhão de reais, não faz sentido nenhum essa estratégia. Deveria ser de longo prazo, de ponderar o que ela gasta hoje, mas também o que gastou desde que entrou no programa. Não precisa ser nenhum gênio ou especialista em marketing para desenhar esse tipo de condição, basta querer, efetivamente, criar esse tipo de relação de longo prazo.

Um bom indicativo desta relação, de como o clube não precisa fazer o que está fazendo, é o ano de 2021. Em função da pandemia, praticamente não tivemos receitas de bilheteria. Os estádio estavam fechados. Ainda assim, o clube fechará o ano com R$ 1 bilhão em receitas. Tem necessidade de sangrar o torcedor? Precisou do dinheiro do sócio e do torcedor no estádio para chegar onde chegou? A prova está aí de que não precisava.

Além da questão do benefício no ingresso, temos outro problema grave que o programa foi pensado para atender apenas quem pode ir ao estádio. Estamos falando de 3%, 4%, 5% da base de torcedores. A grande maioria não tem condição de ir ao estádio. Precisamos criar benefícios de localmente, onde o torcedor está. Levar conteúdo do clube, ter eventos. Precisamos levar o clube a quem não tem condições de vir ao clube. Esse cara vai começar a ver vantagens em ser sócio-torcedor em Manaus ou Fortaleza. Hoje, essas pessoas que contribuem, elas fazem isso como uma ajuda ao clube. E poderíamos ter um número de sócios-torcedores muito maior.


L!: E quanto ao direito a voto do sócio-torcedor?


R.H.:

Defendemos da ampliação do quadro de sócios do Flamengo. Olhamos outros clubes fora e no Brasil, como o Internacional, e vemos que o Flamengo poderia ter uma participação muito maior do seu torcedor no processo político, mas não defendemos a participação do sócio-torcedor com o voto por uma razão simples. Esse nome foi criado dentro de um projeto de marketing de uma empresa de bebidas, em 2012 ou 2013, mas não guarda relação com a realidade.

O sócio-torcedor se chama assim por marketing, mas ele não é sócio. É uma versão tupiniquim dos season-tickets da Europa. Não são associados do clube, não paga para ser associado do clube, frequentar a sede e ter direito político. Da mesma maneira que somos contra a dar prioridade absoluta ao associado do clube, passando na frente do sócio-torcedor que paga por isso. São coisas diferentes. Podemos e devemos ter programas de incentivo ao sócio-torcedor com desconto para ele se tornar sócio do clube, se ele quiser ser. E nem todos vão querer.

Temos que ter programas de incentivo que garanta ao associado do clube que tenha acesso aos níveis mais altos de sócio-torcedor, mas são coisas diferentes. As pessoas pagam valores diferentes por benefícios diferentes.


L!: O que pensa a respeito da criação da Liga e qual deve ser o papel do Flamengo neste sentido?

R.H.: A Liga é inevitável. Em todos lugares do mundo, você tem ligas independentes, organizadas pelos clubes. Estou me referindo aos mercados mais desenvolvidos. É uma questão inevitável e não tem como o Flamengo não ser protagonista nesse processo. A proposta que está tramitando, que os clubes assinaram um acordo, confesso que não conheço profundamente. As informações que tenho são pela imprensa. Parece que será pago um adiantamento aos clubes. Precisamos ter cuidados. A realidade do futebol brasileiro, em ponto de vista financeiro, não é a realidade do Flamengo. Sabemos que a grande maioria dos clubes passa por uma situação muito difícil.

Esses clubes têm uma tendência natural de, se balançar dinheiro na frente, vende o boi magro. Vende o jantar para comprar o almoço. O Flamengo tem uma situação diferente. Se organizou e tem um poder de barganha diferente. Não conheço os detalhes, mas acho que o clube precisa considerar que, neste aspecto, tem interesses diferentes, em alguns casos até divergentes, da maioria. Não precisa desse dinheiro no curtíssimo prazo, e sim um modelo de negócios que maximize o retorno a médio e longo prazo. Só gostaria de fazer essa observação. A Liga é inevitável, não pode ser administrada pela confederação. Não é assim em qualquer lugar desenvolvido no mundo.


L!: Enquanto a Liga não sai, como gerir a relação com essas entidades?

R.H.: Costumo dizer, em nossa chapa, não temos nenhum pudor em elogiar o que temos que elogiar. Até para termos credibilidade na hora de criticar. Não está tudo errado, tem coisas que foram bem feitas e áreas no Flamengo que funcionam bem. Estamos em um período eleitoral e seria de se esperar que o presidente usasse recursos, comprometesse o longo prazo do clube para reforçar a equipe, aumentar chances de ser campeão e ter um beneficio político. Isso é algo histórico no clube. De forma muito louvável, a atual diretoria não fez isso. Respeitou e continua respeitando o equilíbrio financeiro do Flamengo. Há coisas muito positivas.

Talvez eu modificasse um pouco ali e aqui a forma, mas acho que hoje o Flamengo defende seus direitos juntos às entidades, tem uma postura de enfrentar quando precisa enfrentar. As pessoas me perguntam isso achando que irei criticar a relação com a CBF, com a Conmebol, Ferj, mas acho que, no geral, é positiva. Talvez mudasse o tom, mas acho que o clube passou a adotar uma forma de se relacionar que é coerente com o protagonismo que tem. É uma crítica que eu fazia à gestão anterior, do Eduardo Bandeira de Mello. Essa gestão tem um posicionamento mais firme. No geral, vejo como positivo e toda vez que o interesse do clube for atacado ou sofrer algum tipo de problema é dever da diretoria defendê-lo. Seja na Ferj ou na CBF. Neste aspecto, a diretoria tem ido bem.

‘Hoje, o Esporte Olímpico é um exemplo do que acontece quando temos um grande diretor técnico e que ele transcende a política. Muda o governo, como mudou, e as pessoas não mudaram o Marcelo Vido.’


L!: Sobre os Esportes Olímpicos, quais são os projetos da chapa para esta pasta do clube?

Quando entrei no Flamengo já tinha uma rodagem no mercado de gestão esportiva e, quando saí, em 2009, rodei em grandes agência, trabalhei como consultor para diversas entidades, para a CBV, CBF e para nove dos atuais 20 clubes da Série A. Fui diretor de marketing da CBB. Digo isso porque o Marcelo Vido, que toca os Esportes Olímpicos do Flamengo desde 2013, faz um trabalho excepcional. Explica muito da continuidade do trabalho. Hoje, o Esporte Olímpico é um exemplo do que acontece quando temos um grande diretor técnico e que ele transcede a política. Muda o governo, como mudou, e as pessoas não mudaram o Marcelo Vido, que passou a ser algo maior do que a política. Ele é técnico de grande qualidade.

É preciso dar o crédito ao Póvoa (Alexandre, ex-VP) e hoje ao Kroll (atual VP dos E.O.) por darem condições de trabalhar. Se a área política não permite, o técnico não consegue trabalhar. Existe esse mérito, também. Eu vejo com muita satisfação o trabalho que vem sendo feito. Tudo na vida pode ser aprimorado, mas há de se reconhecer que o Flamengo está no caminho certo neste aspecto.


L!: E em relação à Sede e ao Estádio da Gávea, quais são os planos?

R.H.:

Na Sede, especificamente, não muita coisa foi feita desde que saí, em 2009. Entendo perfeitamente que o Flamengo precisou se reestruturar e a prioridade foi o futebol, que é o que dá retorno mais rápido. Entendo que, a essa altura do campeonato, o clube chegou a um nível que permite fazer equipamento melhor na sede para o associado. O Flamengo já tem condições financeiras, caixa suficiente, para investir na Gávea. Essa é uma questão que acho importante, que no passado não era possível, mas agora já é. A diretoria que assumir a partir de janeiro tem condições para isso.

Em relação ao estádio, a minha posição é que precisamos ter um estádio. Aquilo faz parte da história do Flamengo. O gol do Valido, o Fla-Flu da Lagoa, a grande geração da década de 70, que cresceu ali. Eu não acredito que José Bastos Padilha como um equipamento para jogos da equipe profissional. Hoje, a realidade é diferente. Não vamos conseguir construir ali um estádio do tamanho equivalente ao que o Flamengo precisa. Não acredito em dois estádios simultâneos para o time profissional por uma série de questões, especialmente do ponto de vista comercial. Não funciona em nenhum lugar do mundo. Há uma série de conflitos comerciais com os parceiros.

Eu acredito em um estádio reformado para receber jogos da base, que, de certa forma, já acontece hoje. É fundamental para a história do Flamengo preservar e ter o estádio funcionando. De certa forma, é até algo legal, bacana, que continue a ser o lugar onde as novas gerações do Flamengo tenham as primeiras experiências de jogar pelo clube naquele mesmo gramado onde tanta gente importante surgiu na história do clube.


L!: Muito tem se falado a respeito da internacionalização da marca Flamengo. É um ponto que a sua gestão tem como foco? Como desenvolver esse projeto?

R.H.:

Existe um entendimento errado em relação a isso. Se estamos falando do projeto Tondela, não tem nada a ver com o projeto de internacionalização de marca, ao menos nesse momento. O que se tem é uma proposta de negócio para aproveitar uma arbitragem que se tem em relação aos direitos de jogadores. Nos últimos 10, 15 anos, os clubes que têm o melhor desempenho em quantidade e volume financeiro de venda de jogador no mundo são os portugueses. Benfica, Sporting, com uma história muito rica de venda de atletas. Não só de vendas muito altas, mas de volume de vendas.

O Benfica costuma ter um faturamento espetacular com venda de atletas, mas o que pouco se percebe é que essas vendas não são de 40, 50, 60 milhões de euros. O Benfica vende uma quantidade grande de atletas por valores relativamente pequenos em relação ao mercado europeu. É uma fábrica de jogadores que tem sido muito importante para o clube nesse modelo de negócios.

Quando se olha com calma, os relatórios da Fifa sobre transferência de jogadores, as rotas dos jogadores, são dois pontos importantes. O brasileiro continua sendo a grande mercadoria do mundo do futebol, disparado. Estamos muito à frente da França e Argentina, que são o segundo e terceiro colocados. E, segundo, que é concentrado nesta rota “Brasil-Portugal”. São dois indicadores dos relatórios que não mudam há 10 anos.

Isso acontece por conta da questão cultural, é mais fácil de se adaptar. Então há uma grande quantidade de jogadores brasileiros que vão para Portugal. Nisso, se adaptam à Europa e, quando estão jogando há dois anos, já provaram que estão adaptados ao estilo de jogo, atuando em campeonatos europeus, imediatamente o risco desse jogador despenca e o valor sobe muito. Em um estágio de um ano, o atleta sai do Brasil valendo 10. Se passar um ano em Portugal, o valor dele, imediatamente, sobe para 30 ou 40. É uma oportunidade interessante na qual, ao em vez de vender diretamente, você matura esse jogador na Europa e tem uma oportunidade de negócio muito legal.

‘Temos 42 milhões de torcedores do Flamengo, dos quais 20% moram no Rio de Janeiro. São milhões de pessoas fora do Rio de Janeiro, sem acesso ao clube no dia a dia. E o clube tem zero política para se relacionar com essas pessoas. Tem que nacionalizar a marca antes de internacionalizar.’

A conclusão é: por que não tenho meu próprio clube em Portugal? Em vez de vender por 10, eu mesmo vendo por 40. Essa é a lógica por trás da operação de Tondela. Faz sentido do ponto de vista do negócio. Mas isso não tem nada a ver com internacionalização de marca pois a marca Flamengo não terá visibilidade fora do país. Você irá preservar a marca do Tondela e terá acesso às receitas recorrentes baixas. É um projeto interessante, mas não é um projeto de internacionalização de marca.

Em relação a isso, temos uma prioridade antes de internacionalizar, que é nacionalizar. Temos 42 milhões de torcedores do Flamengo, dos quais 20% moram no Rio de Janeiro. São milhões de pessoas fora do Rio de Janeiro, sem acesso ao clube no dia a dia. E o clube tem zero política para se relacionar com essas pessoas. Tem que nacionalizar a marca antes de internacionalizar. Tem que perguntar como se faz para relacionar com o torcedor em Manaus, em Fortaleza, em Brasília. Isso é a prioridade. Até porque não existe internacionalização de marca sem visibilidade dos jogos. O chinês não vai passar a torcer para o Flamengo se ele não vê jogo e não conhece os jogadores. É um investimento que, neste momento, não dá retorno. O investimento tem que ser feito em nacionalização.


L!: Tem algum ponto do Estatuto que pretende colocar em discussão?

R.H.:

Não tem um ponto específico. Precisamos modernizar o estatuto. Foi criado em um momento diferente, em um mundo diferente. Tem vários aspectos que precisam ser modernizados. Estamos vivendo uma crise, um problema, por conta de um ponto, que é o voto a distância. Isso é só um dos problemas. O processo de governança, independência dos poderes, que é cada vez mais importante na medida que o volume de recursos é maior, ter um modelo de governança mais claro para a sociedade e parceiros. Precisamos modernizar o estatuto e isso é quase uma unanimidade, independente das chapas.


L!: O que pode ser feito em relação ao acidente do Ninho do Urubu?

R.H.:

Vamos por partes. Na questão da negociação, que é arbitrar os valores das indenizações. Fazendo um disclaimer para começar: nenhum valor paga vida de ninguém. Por outro lado, o Flamengo, por ser Flamengo, não tem que pagar mais do que o mercado paga. Eu não sou especialista nesse tema, mas as pessoas que conheço e são especialistas me dizem que as negociações estão em linha com o que é pago para esse tipo de situação lamentável que aconteceu. Do ponto de vista jurídico, eu não tenho críticas a fazer. Minhas críticas são em outras áreas.

Em relação à memória, acho que é a área da comunicação, que é como o clube se comunicou com a sociedade e com as famílias. Neste ponto tenho críticas a fazer. Faltou ao clube uma política de gestão de crises. Se tivesse sido implementada, teria sabido como lidar com essa questão imprevisível, sobre como lidar de forma mais transparente com a sociedade e famílias. Se demorou demais para explicar o que estava sendo feito, apurar e acolher as famílias. Em termos de comunicação, sim, o clube conduziu de forma equivocada.

‘Em relação à apuração, é fundamental. A gente precisa apurar para indicar os culpados, mas também entender o que aconteceu para evitar que volte a acontecer. O processo de apuração tem esses dois sentidos.’

Em relação à apuração, é fundamental. A gente precisa apurar para indicar os culpados, mas também entender o que aconteceu para evitar que volte a acontecer. O processo de apuração tem esses dois sentidos. O primeiro é levar à Justiça quem é responsável e o segundo é aprender o que aconteceu para nunca mais acontecer. O Flamengo deveria ter uma política de segurança relacionada a incêndio, acidente, absolutamente de altíssimo nível, como um aprendizado do que aconteceu. O importante não são as pessoas, e sim os processos.

Se tiver processos bem desenhados, políticas de governança que garantam esses processos, irá funcionar independente da pessoa. Se houver um processo que impede você de ignorar uma notificação da Prefeitura e te obriga a responder e fazer o que precisa ser feito, talvez não tivéssemos tido esse acidente. Como tudo é feito sem regras e sem um processo pré-estabelecido, ficamos, realmente, entregues às pessoas. As pessoas, todos nós, somos falhos e tomamos decisões equivocadas. A maneira certa é tirar as decisões críticas das pessoas. Dar poder aos processos. Aí teremos como evitar problemas como esse.


L!: Uma mensagem final para a torcida.

R.H.:

Eu queria dizer o seguinte. O pessoal da assessoria não gosta muito, mas eu prefiro sempre falar isso sempre de forma transparente. Eu não faço nenhuma questão de ser presidente do Flamengo. Nós, como grupo, fazemos questão em apontar os problemas e propor soluções. Assim, acreditamos que podemos ajudar o Flamengo. Podemos fazer isso ganhando a eleição e sentando na cadeira ou como oposição propositiva, que indica o que precisa ser feito e o papel de chato. Assim temos condições de ajudar o clube. Se será feito com um vitória na eleição ou proposição, para mim é indiferente.

Já fui vice-presidente do clube por quatro anos. Minha cota de vaidade já satisfiz. É um cargo muito difícil. Eu reconheço a dificuldade do Landim, não é fácil carregar esse peso. Nosso objetivo é provocar a discussão de todos esses pontos que tocamos aqui.

Para mim, francamente, tanto faz se faremos como situação ou oposição. O importante é saber como podemos ajudar o Flamengo a melhorar, estar sempre levantando o que está errado e o que poderia ser feito para melhorar. Essa é a nossa filosofia.


QUEM É:

Nome:

Ricardo Hinrichsen


Chapa:

Branca


Ocupação:

Administrador


Cargos anteriores no Flamengo:

Vice-Presidente e Diretor Executivo de Marketing

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